Após a formalização do Contrato de Representação Comercial e após iniciada a execução do pactuado, o Representante Comercial passa a receber a contraprestação pelos serviços de intermediação dos negócios realizados junto ao cliente e em favor da empresa representada, adquirindo o direito às comissões quando do pagamento dos pedidos ou propostas, na forma do art. 32 da Lei nº 4.886/65.
Ocorre que, não raramente, a empresa representada realiza descontos nas comissões devidas ao profissional ou à empresa de representação comercial, a título de tributos incidentes na operação comercial intermediada pelo representante e outras despesas, a exemplo do frete da mercadoria.
Referida prática, no entanto, contraria o teor da Lei nº 4.886/65, com a redação dada pelas Leis nº 8.420/92 e nº 12.246/2010, regulamentadora da atividade de representação comercial autônoma, a qual normatiza, de forma objetiva, o valor sobre o qual deve incidir o cálculo das comissões do representante comercial.
Nesse sentido, analisando as regras legais aplicáveis ao Contrato de Representação Comercial, se constata que não há previsão em lei para a realização de descontos sobre o valor das mercadorias vendidas e intermediadas pelo representante comercial, o qual atua intermediando a venda entre a empresa representada e o cliente, de modo que despesas como impostos, fretes, embalagens, entre outros, não devem ser subtraídos da base de cálculo da comissão devida ao Representante, vez que referida prática, em verdade, acaba transferindo para o representante o risco próprio do negócio desenvolvido pela empresa representada.
Assim, a regra legal prevista no artigo 32 § 4º da Lei nº 4.886/65, com as alterações introduzidas pela Lei nº 8.420/92, expressamente prevê que as comissões deverão ser calculadas pelo valor total das mercadorias, de modo que o preço constante da nota fiscal é o que melhor reflete o resultado obtido pelas partes, para fins da base de cálculo da comissão devida ao Representante Comercial, conforme a seguir se reproduz:
Art. 32. O representante comercial adquire o direito às comissões quando do pagamento dos pedidos ou propostas. (Redação dada pela Lei nº 8.420, de 8.5.1992)
(…)
§ 4º. As comissões deverão ser calculadas pelo valor total das mercadorias.
1 Victor Felipe Fernandes de Lucena. Graduado em Direito pelo Centro Universitário 7 de Setembro (UNI7); Pós- Graduado em Direito Processual pelo Centro Universitário 7 de Setembro (UNI7); Especialista em Direito Empresarial e Direito Civil (Instituto Damásio de Direito); Mestrando em Direito Processual pelo Centro Universitário Unichristus; Assessor Jurídico do CORE-CE; Membro do Escritório Siqueira Advogados; Advogado (OAB/CE 33.933).
No estudo doutrinário da matéria, Rubens Edmundo Requião faz o seguinte comentário a respeito do referido dispositivo legal:
Veda-se a prática antiga de descontar uma série variada de custos do valor da fatura, tais como despesas financeiras, impostos, despesas de embalagem, etc. Tal dispositivo talvez venha a causar uma redução, em novos contratos, dos percentuais de comissão, para compensar a sua incidência sobre o ICMS e IPI, impostos que integram o preço. Por valor total das mercadorias entendemos o seu preço consignado na nota fiscal […]. O preço constante da nota fiscal é o que melhor reflete o resultado obtido pelas partes (representante e representado) sendo justo que sobre ele se apoie o cálculo da comissão. (In: Nova Regulamentação da Representação Comercial. Curitiba: Livraria Jurídica. 1993.p. 79).
A jurisprudência pátria acompanha a doutrina citada acima, conforme ementa de acórdão a seguir transcrito a título exemplificativo:
REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. PESSOA JURÍDICA. RESCISÃO DO CONTRATO. INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DO CUMPRIMENTO POR DOENÇA DO SOCIO-GERENTE DA REPRESENTANTE. COMISSÕES. BASE DE CALCULO. LEI Nº 8.420/92. […].
A partir do advento da Lei n 8.420, de 08 de maio de 1992, a comissão devida ao representante comercial incide sobre o valor total da mercadoria nele se incluindo o ICMS por tratar de tributo indireto cujo valor está embutido no preço pago pelo consumidor. Hipótese de aplicação imediata da lei. (ApCv nº 197059959. Data 27/05/1997 9º Câmara Cível do TJRS. Relatora: Maria Isabel de Azevedo Souza).
Desta forma, mesmo que a hipótese de desconto de impostos sobre as comissões esteja prevista no contrato firmado entre as partes (representada e representante comercial), a prática da ilegalidade acima não subsistirá, podendo a parte prejudicada questionar e reivindicar o pagamento da comissão integral (sobre o valor da mercadoria constante da nota fiscal emitida).
Ademais, constata-se que tais cláusulas prejudiciais ao direito de pagamento integral das comissões ao representante comercial, sempre que questionadas perante o Judiciário, tiveram sua nulidade declarada, em razão de violar a norma legal que rege a matéria em apreço.
Portanto, ainda que amparado por cláusula contratual, referido desconto não prospera, devendo as comissões do representante comercial, a teor do previsto na Lei e do entendimento doutrinário e das decisões judiciais, serem calculadas sobre o valor total das mercadorias, sem qualquer espécie de desconto.